Nirvana Lado-B

Porque Nirvana vai além de Nevermind e "Smells Like Teen Spirit"
Nirvana no MTV Video Music Awards – 1992 (Ensaios)

No dia 8 de setembro de 1992, Krist Novoselic e Dave Grohl estavam em Los Angeles, CA para ensaiar as musicas que seriam tocadas pelo Nirvana no MTV Video Music Awards no dia seguinte. Kurt Cobain estava tratando seu vicio em heroína em Marina Del Rey.

Kurt contra as drogas

O Dr. Robert Fremont, um conselheiro de Los Angeles, acompanhava Kurt na reabilitação no Exodus Recovery Center, em Marina Del Rey. Ele também estava cuidando da dependência química de Courtney Love.

Fremont havia perdido sua licença para clinicar depois de ter receitado narcóticos para si mesmo. Ele acabou recuperando a licença e começou a clinicar, tratando dos problemas de drogas de alguns dos maiores astros de Hollywood. Ele tinha sucesso numa profissão em que os índices de recaída são extraordinariamente altos, talvez porque tivesse experiências direta com o vicio. Ele defendia a prescrição generosa de drogas legais a clientes que estavam se desintoxicando, metodologia que adotou com Kurt.

Fremont começara a usar um plano experimental (porem ilegal na época) de tratamento em Kurt. Ele envolvia ministra-lhe doses diárias de buprenorfina. Este narcótico relativamente benigno estimula os receptores de opiato do cérebro. Com isso, pode cortar o desejo pela heroína, ou assim supunha Fremont. Em Kurt, o método funcionou, pelo menos temporariamente. Kurt chegou a escrever em seu diário:

“Fui introduzido na buprenorfina, que descobri que alivia a dor (do estômago) em questão de minutos. Ela tem sido usada experimentalmente em alguns centros de desintoxicação para a interrupção no consumo de opiatos e de cocaína. A melhor coisa nela é que não ha nenhum efeito colateral conhecido. Ela atua como um opiato, mas não deixa você alto. A classe de potência da buprenorfina é a de um barbiturato moderado e, numa escala de um a dez, é grau um, e a heroína é de grau dez”.

Nirvana no MTV Video Music Awards – Ensaio

Naquela terça-feira, Cobain recebeu licença do Exodus para ensaiar com o Nirvana no UCLA Edwin W Pauley Pavilion. Apesar de sua reabilitação em curso, as atividades não se interromperam e a banda estava programada para tocar no dia seguinte no MTV Video Music Awards. O evento era o equivalente do entediante Oscar da Academia. A premiação musical era mais badalada e respeitada na época do que o Grammy Awards, e era acompanhada de uma cerimônia que atraia os manda chuvas do setor.

O Nirvana fora indicado para três prêmios e, em Julho, havia sido anunciado que eles tocariam no programa. Ainda havia dúvidas se Kurt poderia, ou deveria, tocar em um programa de premiação em seu estado de saúde. Kurt decidiu, por pressão dos empresários, tocar. “Ele odiava ir a shows de premiação e jamais gostava de ser reconhecido. Mas trabalhava e se empenhava muito em ser reconhecido.” explica o empresário Danny Goldberg.

O repertório

Quando Kurt Cobain entrou no Pavilhão Pauley da UCLA, dirigiu-se a Amy Finnerty da MTV e disse a ela: “Eu vou tocar uma musica nova“. “Ele estava todo entusiasmado com isso e agiu como se isso fosse um presente“, lembra Finnerty. Para grande surpresa dos executivos da MTV, que esperavam ouvir “Teen Spirit“, eles tocaram rapidamente “Rape Me“. Na verdade, não era uma música nova (o Nirvana a vinha tocando em shows durante dois anos), mas era nova para as altas patentes da Mtv. Tinha uma letra de apenas onze linhas, com um coro que dizia: “Rape-me, my friend, rape me again” (“Estupre-me, meu amigo, estupre-me de novo“). Tinha a mesma dinâmica cativante suave/barulhenta de “Teen Spirit” e, com o estribilho insólito, criava uma perfeita estética Cobain, bonita assombrada e perturbadora.

Finnerty foi imediatamente arrastada para um trailer da produção onde recebeu um sermão de seus chefes sobre a escolha da canção do Nirvana. ele acharam que “Rape Me” era sobre a MTV. “Ah, qual é“, protestou ela. “Eu posso garantir a vocês que ele não compôs a canção para nós ou sobre nós.” Kurt já a havia composto no final de 1990, mas em 1992 ele havia alterado a letra para incluir uma critica severa á “our favorite inside source” (“nossa fonte interna favorita“), uma referência a Vanity Fair. Embora ele defendesse a canção nas entrevistas como uma alegoria aos abusos da sociedade, em setembro de 1992 ela também passara a representar uma metáfora mais pessoal para o modo com ele se sentia tratado pela mídia, seus empresários, parceiros de banda, seu vicio e pela MTV (como os executivos da MTV haviam astutamente percebido).

Uma batalha de vontades começou a ser travada entre os mandachuvas da MTV e Kurt, ainda em reabilitação, tendo Finnerty e a Gold Mountain como intermediários. A MTV ameaçou tirar o Nirvana do show. Kurt disse que isso era ótimo. a MTV ameaçou parar de exibir vídeos do Nirvana. Kurt disse que isso era ótimo, embora, no fundo, provavelmente estivesse receoso a respeito. E então a rede aumentou a parada e ameaçou parar de exibir vídeos de outros artistas agenciados pela Gold Mountain.

Finnerty foi convocada para fazer o leva-e-traz entre os dois lados e se dirigiu de carro para o Exodus com Courtney, Frances e a babá Jackie para falar com Kurt, que tinha sido levado de volta á instituição logo depois do ensaio. Sentaram-se no gramado e discutiram as opções, mas nenhuma solução foi encontrada e Kurt teve de voltar correndo para a terapia. Cada esforço na reabilitação fazia com que a terapia passasse a ocupar parte maior em seu tratamento, embora ele ainda se recusasse a buscar aconselhamento quando não em reabilitação.

As duas musicas programadas para serem tocadas pelo Nirvana no MTV Video Music Awards do dia 9 eram “Rape-me” e “Tourrets“. Mas Kurt reconsiderou sua escolha da música, porem, só depois que lhe disseram que Finnerty seria demitida se o Nirvana tocasse “Rape Me“. Fora clipes de “Rape Me” que foram transmitidos na TV Europeia e um minusculo vídeo de Kurt no palco com sua guitarra que foi mostrado durante os créditos do show ao vivo no dia 9, nenhum outro registro do ensaio foi divulgado até hoje.